Texto 11A05
    Não negueis jamais ao erário, à administração, à União os  seus direitos. São tão invioláveis, como quaisquer outros. O  direito dos mais miseráveis dos homens, o direito do mendigo, do  escravo, do criminoso, não é menos sagrado, perante a justiça,  que o do mais alto dos poderes. Antes, com os mais miseráveis é  que a justiça deve ser mais atenta, e redobrar-se de escrúpulo,  porque são os mais mal defendidos, os que suscitam menos  interesse, e os contra cujo direito conspiram a inferioridade na  condição com a míngua nos recursos. 
    Preservai, juízes de amanhã, preservai vossas almas  juvenis desses baixos e abomináveis sofismas. A ninguém  importa mais do que à magistratura fugir do medo, esquivar-se de  humilhações, e não conhecer covardia. Todo bom magistrado tem  muito de heroico em si mesmo, na pureza imaculada e na plácida  rigidez, que a nada se dobre, e de nada se tenha medo, senão da  outra justiça, assente, cá embaixo, na consciência das nações, e  culminante, lá em cima, no juízo divino. 
    Não tergiverseis com as vossas responsabilidades, por  mais atribulações que vos imponham, e mais perigos a que vos  exponham. Nem receeis soberanias da terra: nem a do povo, nem  a do poder. O povo é uma torrente, que rara vez se não deixa  conter pelas ações magnânimas. A intrepidez do juiz, como a  bravura do soldado, arrebata-o e o fascina.
    Os poderosos que investem contra a justiça, provocam e  desrespeitam tribunais, por mais que lhes espumem contra as  sentenças, quando justas, não terão, por muito tempo, a cabeça  erguida em ameaça ou desobediência diante dos magistrados, que  os enfrentam com dignidade e firmeza.
    Na missão do advogado também se desenvolve uma  espécie de magistratura. As duas se entrelaçam, diversas nas  funções, mas idênticas no objeto e na resultante: a justiça. Com o  advogado, justiça militante. Justiça imperante, no magistrado.
 Rui Barbosa. Oração aos moços. Brasília: Senado Federal, 
  Conselho Editorial,2019, p.61-63 (com adaptações).