O texto seguinte servirá de base para responder à questão.
 Eloquência singular 
Fernando Sabino 
Mal iniciara seu discurso, o deputado embatucou: 
— Senhor Presidente: eu não sou daqueles que... 
O verbo ia para o singular ou para o plural? Tudo indicava o plural. No entanto, podia perfeitamente ser o singular: 
— Não sou daqueles que...
 Não sou daqueles que recusam... No plural soava melhor. Mas era preciso precaver-se contra essas armadilhas da linguagem — que recusa? — ele que tão facilmente caía nelas, e era logo massacrado com um aparte. Não sou daqueles que... Resolveu ganhar tempo:
 — ...embora perfeitamente cônscio das minhas altas responsabilidades como representante do povo nesta Casa, não sou...
Daqueles que recusa, evidentemente. Como é que podia ter pensado em plural? Era um desses casos que os gramáticos registram nas suas questiúnculas de português: ia para o singular, não tinha dúvida. Idiotismo de linguagem, devia ser. 
— ...daqueles que, em momentos de extrema gravidade, como este que o Brasil atravessa... 
Safara-se porque nem se lembrava do verbo que pretendia usar:
 — Não sou daqueles que... 
Daqueles que o quê? Qualquer coisa, contanto que atravessasse de uma vez essa traiçoeira pinguela gramatical em que sua oratória lamentavelmente se havia metido de saída. Mas a concordância? Qualquer verbo servia, desde que conjugado corretamente, no singular. Ou no plural:
 — Não sou daqueles que, dizia eu — e é bom que se repita sempre, senhor Presidente, para que possamos ser dignos da confiança em nós depositada...
 Intercalava orações e mais orações, voltando sempre ao ponto de partida, incapaz de se definir por esta ou aquela concordância. Ambas com aparência castiça. Ambas legítimas. Ambas gramaticalmente lídimas, segundo o vernáculo: 
— Neste momento tão grave para os destinos da nossa nacionalidade.
 Ambas legítimas? Não, não podia ser. Sabia bem que a expressão "daqueles que" era coisa já estudada e decidida por tudo quanto é gramaticoide por aí, qualquer um sabia que levava sempre o verbo ao plural: 
— ...não sou daqueles que, conforme afirmava... 
Ou ao singular? Há exceções, e aquela bem podia ser uma delas. Daqueles que. Não sou UM daqueles que. Um que recusa, daqueles que recusam. Ah! o verbo era recusar: 
— Senhor Presidente. Meus nobres colegas.
 A concordância que fosse para o diabo. Intercalou mais uma oração e foi em frente com bravura, disposto a tudo, afirmando não ser daqueles que... 
— Como?
Acolheu a interrupção com um suspiro de alívio: 
— Não ouvi bem o aparte do nobre deputado. 
Silêncio. Ninguém dera aparte nenhum. 
— Vossa Excelência, por obséquio, queira falar mais alto, que não ouvi bem — e apontava,  agoniado, um dos deputados mais próximos. 
— Eu? Mas eu não disse nada... 
— Terei o maior prazer em responder ao aparte do nobre colega. Qualquer aparte. 
O silêncio continuava. Interessados, os demais deputados se agrupavam em torno do orador, aguardando o desfecho daquela agonia, que agora já era, como no verso de Bilac, a agonia do heroi e a agonia da tarde. 
— Que é que você acha? — cochichou um.
— Acho que vai para o singular. 
— Pois eu não: para o plural, é lógico. 
O orador seguia na sua luta:
 — Como afirmava no começo de meu discurso, senhor Presidente... 
Tirou o lenço do bolso e enxugou o suor da testa. Vontade de aproveitar-se do gesto e pedir ajuda ao próprio Presidente da mesa: por favor, apura aí pra mim, como é que é, me tira desta... 
— Quero comunicar ao nobre orador que o seu tempo se acha esgotado.
 — Apenas algumas palavras, senhor Presidente, para terminar o meu discurso: e antes de terminar, quero deixar bem claro que, a esta altura de minha existência, depois de mais de vinte anos de vida pública... 
E entrava por novos desvios: 
— Muito embora... sabendo perfeitamente... os imperativos de minha consciência cívica... senhor Presidente... e o declaro peremptoriamente... não sou daqueles que... 
O Presidente voltou a adverti-lo que seu tempo se esgotara. Não havia mais por que fugir:
 — Senhor Presidente, meus nobres colegas!
Resolveu arrematar de qualquer maneira. Encheu o peito e desfechou: 
— Em suma: não sou daqueles. Tenho dito. 
Houve um suspiro de alívio em todo o plenário, as palmas romperam. Muito bem! Muito bem! O orador foi vivamente cumprimentado. 
           
               Assinale a alternativa que apresenta a análise sintática CORRETA da oração "O orador foi vivamente cumprimentado.".