Atenção: Para responder à questão, baseie-se no texto abaixo.
[A máquina funcional e a arte literária]
O homem está começando a entender como se desmonta e como se torna a montar a mais complicada e imprevisível de todas as suas máquinas: a linguagem. O mundo de hoje, em relação àquele que cercava o homem primitivo, é muito mais rico de palavras, de conceitos e de signos. Mas é sobretudo mais rico em operações computacionais.
Entregue-se a um computadora tarefa de realizar operações de fato criativas: será a máquina capaz de substituir o poeta e o escritor? Assim como já temos máquinas que leem, máquinas que executam análises linguísticas de textos literários, máquinas que traduzem, máquinas que resumem, teríamos, então, máquinas capazes de criar e compor poemas e romances?
O que interessa nem tanto é essa pergunta específica, mas sua viabilidade teórica, que poderia abrir uma série de conjecturas insólitas. Nesse momento, não estou pensando numa máquina capaz apenas de uma produção literária em série; estou pensando numa máquina que escreva e ponha em jogo, na página, todos aqueles elementos que costumamos considerar como os mais ciosos atributos da intimidade psicológica, da experiência, da imprevisibilidade das mudanças de humor, os sobressaltos, as aflições e as iluminações interiores. E o que seriam eles, senão um número correspondente de campos linguísticos, dos quais podemos tranquilamente chegar a estabelecer léxico, gramática, sintaxe e propriedades permutativas?
Com efeito, já que os desenvolvimentos da cibernética têm por alvo máquinas capazes de aprender, de mudar o próprio programa, de desenvolver suas próprias necessidades, nada nos impede de prever uma máquina literária que, a certa altura, sinta-se insatisfeita com o próprio tradicionalismo de suas funções e comece a propor novas maneiras de entender a escritura e a desorganizar completamente os próprios códigos, na busca não apenas de uma nova linguagem, mas de novas percepções do mundo.
(Adaptado de: CALVINO, Italo. Assunto encerrado. Trad. Roberta Barni. São Paulo: Companhia das Letras,2006, p.203-204)
Considera-se que a linguagem é a mais complicada e imprevisível das máquinas criadas pelo homem